quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Divinópolis e a novela da cidade que não apareceu na novela

Muito aldeão aí, ancho da vida, e mais uns tantos (estes mais) indignados porque a personagem Tereza Cristina, na pele da atriz Christiane Torloni, da novela global Fina Estampa, de Aguinaldo Silva, mencionou a cidade de Divinópolis, em cena que foi ao ar no capítulo de segunda-feira (27).
Na ficção, o mordomo Crô (Marcelo Serrado) e o motorista Baltazar (Alexandre Nero) brigavam quando caem sobre a cama da madame e ela os surpreende. Logo insinua que os dois têm um caso e pergunta onde iriam passar a lua de mel, se em Divinópolis ou Xiquexique.
O assunto – que certamente mudou e mudará a vida de tanta gente – ganhou a internet e as ruas da cidade, muitos dizendo-se ofendidos com a tal menção.
Não há de quê.
Uma vez ao menos, Divinópolis não apareceu em rede nacional por causa dos estragos e do descaso nas enchentes, de prefeito que encomendou diploma de “qualidade administrativa” e mantém cabidaço de emprego, de vereadores que, contra a vontade do povo, votam para aumentar a quantidade de edis e o próprio absurdo salário – o qual muito mais pesa do que vale diante da baixa representatividade dos interesses de fato da população. Nem apareceu por causa do pior trânsito do Brasil ou de ter contabilizado 13 homicídios em 50 dias e ostentar o título de uma das mais violentas cidades de Minas Gerais.
Mas Crô e Baltazar não venham mesmo, eles e outros, passarem férias ou lua de mel, porque atrações turísticas aqui não há. Vão ver o quê? As pinturas do santuário? A pracinha? A agonia do rio Itapecerica infestado de capivaras? O portal enferrujado que, plantado no meio da avenida, leva do nada ao lugar nenhum? O maior quebra-molas da Terra? As crateras lunares nas ruas e calçadas onde o IPTU não chega? O virtualíssimo parque da ilha? Carnaval sazonal em parque de exposição, que isso outros há mais e melhor alhures?
Pois que vão para Xiquexique, na Bahia, onde há atrativos à margem do rio São Francisco e, segundo consta, um bem organizado Parque Aquático.
Ou que vão, sim, para Divinópolis, aquela cidade do estado do Tocantins, também conhecida como Ganxo. Esta, sim, cercada das belezas naturais dos rios da Piedade e do Coco, em meio à tranquilidade de pousadas e fazendas, a recomendá-la como ponto turístico e como “melhor lugar para se morar”.
Não convence é que seja esta Divinópolis, dita “princesa do oeste mineiro”, como quer a pretensão ou a indignação requestada pelos aldeões. Até porque Tereza Cristina (leia-se Aguinado Silva) não fez essa distinção de - digamos - mérito. 

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

A fábula do rei zeloso e o horóscopo subversivo

(EUGENIO BUCCI, publicado na Revista Época)
Era uma vez um bom rei que resolveu proibir a mentira. Era um homem ilustrado, tolerante e culto. Seu país era parlamentarista, não tinha censura nem presos políticos. O Estado laico, nação feliz. Mas, naqueles dias, o rei estava preocupado. Não se conformava. Os jornais não se cansavam de publicar notícias imprecisas, até maldosas, e seu povo, a quem ele amava tanto, ficava assim, à mercê de invencionices odiosas, que minavam a normalidade institucional. Não, não era justo.
Então, numa manhã de sol, o rei chamou o primeiro-ministro e pediu a ele de modo polido, muito educado, que levasse ao parlamento uma proposta: escrever na Constituição que os cidadãos passariam a ter direito à "informação veraz". Assim esperava obrigar os jornais a dizer a verdade. Diante de tão cândida encomenda, vinda de um rei tão compreensivo, os parlamentares aquiesceram. Quem haveria de ser contra a "informação veraz"? E quem defenderia a informação mentirosa? Ademais, eles, deputados, eram os que mais penavam com as calúnias desalmadas da imprensa. Ali estava a chance de vingança, que eles tanto esperaram. Era para já.
A emenda constitucional foi aprovada por unanimidade. Imediatamente, providenciou-se a legislação complementar. Se não fosse veraz, a informação não poderia circular. Simples assim. O raciocínio era elementar. Ponto 1: o povo tem direito à "informação veraz". Ponto 2: quem publica uma informação falsa viola o direito do povo. Portanto, ponto 3: nenhuma informação falsa poderia ser admitida. "Nada a ver com censura", disse o primeiro-ministro para tranquilizar a nação.
O astrólogo foi preso, acusado de que suas previsões não eram "informações verazes" – e o povo se revoltou.
Precavidos, os editores de romance cuidaram de estampar, na capa de cada volume, um alerta: "Este livro é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência". Com isso, escaparam do rigor legal. Os jornais, as revistas e os noticiários de rádio e televisão não tiveram a mesma sorte. Viram-se soterrados por milhares de ações judiciais, muitas delas movidas pelo próprio governo, que os acusavam de mentirosos. Qualquer coisa era pretexto: um número errado depois da vírgula, uma letra trocada no sobrenome do ministro. Os artigos de opinião ficaram inviáveis, porque as multas saltaram para a estratosfera. Um articulista condenado a pagar US$ 40 milhões por ter ofendido o primeiro-ministro decidiu se exilar em Miami – o lugar era de mau gosto, vá lá, mas na Flórida ele poderia tomar sol na hora que bem entendesse.
O país do rei zeloso ficou mais triste, mais plúmbeo, mas o povo suportou, acreditando que o sufoco era para o bem da verdade. A sombra da censura se adensou, mas a vida seguiu adiante. Até que, numa tenebrosa noite de quarta-feira, o povo se rebelou. Por quê? Por causa dos astros.
Eis o que aconteceu: naquela quarta, um astrólogo famoso, celebridade nacional, que escrevia o horóscopo no maior diário do país foi encarcerado, sob a acusação de que suas previsões não eram "informações verazes". Pela primeira vez naquele reino, uma revolta de leitores de jornal se converteu num movimento de massa irreversível. A influência dos astros no destino dos mortais podia não ser exatamente "informação veraz", os líderes do movimento admitiam, mas o povo não abria mão de seu direito sagrado de ler os desígnios zodiacais.
Foi uma primavera cósmica. A multidão venceu. O primeiro-ministro, os parlamentares e o próprio rei tiveram de recuar de suas boas intenções. Tiveram de declarar em praça pública que o direito à informação incluía o direito a informações não necessariamente verazes, como aquelas da astrologia. O país inteiro aprendeu que informação veraz na opinião de uns pode não ser tão veraz assim na opinião de outros. Aprendeu mais: que o direito à informação não é a mesma coisa que direito à verdade. É apenas o direito que cada um tem de buscar a verdade a sua maneira, a partir da liberdade de conhecer todas as versões que ela, a verdade, admite – versões que, por sinal, envolvem elementos de mentira na opinião de uns, mas não na de outros. Aprendeu, enfim, que um país tem direito à informação quando o poder não tem o direito de determinar o que é verdade e o que é mentira.
Com tudo isso, até a imprensa daquele país longínquo melhorou um pouco – e o rei zeloso ficou pasmo.
PS: desde 1978, o "direito à informação veraz" consta da Constituição da Espanha, sem acarretar maiores danos. A partir da década de 1990, entrou nas constituições da Argentina, da Venezuela, da Colômbia e do Equador. Recomenda-se atenção.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Os colarinhos sangrentos

(CYRO MARTINS FILHO, no Jornal Zero Hora)
Existem “serial killers” e existem “mass murderers.” Assassinos em série e assassinos de massa. E existem os corruptos que roubam o dinheiro do Estado, chamados “colarinhos-brancos”.
Serial killers são horrendas deformações dessa obra magnífica que é a mente humana. Quando descobertos, e presos, julgados, condenados, geralmente sabe-se a extensão de seus crimes, quantas pessoas mataram, como, onde. Se tudo corre bem, encerram-se suas trajetórias macabras.
Ed Gein, Ted Bundy ou o Maníaco do Parque, Francisco Pereira, são exemplos.
Assassinos de massa são bombas psíquicas que explodem em raiva e loucura e massacram inocentes como Anders Breivik, o norueguês fascista, ou os garotos de Columbine ou Charles Whitman, o atirador da torre de Austin. Seus efeitos maléficos também são mensuráveis e limitados.
A terceira categoria, os “colarinhos-brancos” são uma espécie de cônjuge infiel desta cônjuge complacente que é a sociedade.
Essa terceira categoria criminosa arma trampolinagens, falcatruas, mutretas, golpes. Frauda, burla, desvia, suborna e é subornada. Tudo com dinheiro público. Quando exposta, os nomes que nela se encaixam borram capas de jornais e sujam horários nobres de rádio e televisão durante certo tempo.
Depois, brandamente, os mesmos nomes vão se reintegrando à vida nacional. Seus “feitos” vão sendo esquecidos. Nem buscam a sombra: voltam à vida nacional pública, alguns são mesmo eleitos ou reeleitos, outros integram ou orbitam órgãos oficiais.
Voltam com ar desafiador ou ar comovente (ou ambos) de injustiçados. Põem a culpa na imprensa e pedem controle sobre ela. E a sociedade, cônjuge complacente, perdoa e aceita.
Os “colarinhos-brancos” deveriam ser chamados de “colarinhos-sangrentos”. O que fazem, sem sujar literalmente, claro as mãos, resulta nas mortes de dezenas, centenas, milhares, ou dezenas ou centenas ou milhares de milhares de brasileiros.
São mais que serial killers e mass murderers. São genocidas.
Cada centavo que roubam dentro da estrutura do Estado vai resultar na falta do remédio que dona Fulana esperará e não receberá, lá na ponta, na fila do atendimento público, a tempo de salvar sua vida. Vai resultar na falta de leito ou de médico para o pequeno Fulaninho ser operado ou tratado ou diagnosticado em tempo de salvar sua vida lá na ponta da fila da cidadezinha cujo nome não interessa aos “colarinhos-sangrentos”.
Somados a outros muitos centavos roubados, vão resultar nas estradas maltrapilhas que promovem chacinas atrás de chacinas, vão resultar na falta de professores ou de merenda ou de condições de estudo para milhões de pequenos brasileiros que deixarão de ir à escola para irem às ruas, viver rapidamente e morrer jovens.
Pausa.
Respire.
Como muito do dinheiro público não chega aonde deve chegar, o governo resolve “estudar” um novo imposto para a saúde. Colocar mais de nosso dinheiro à disposição dessas armas de extermínio que são os “colarinhos-sangrentos”. Reforço na ração dos chacais, que, por não matarem com as próprias mãos, acham que seus colarinhos são branquinhos e cheirosos.
Não são. Não esqueça.
São sangrentos. São imundos.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Gramatik – Hit That Jive

Ó abre malas

Duplipensar

DEMÉTRIO MAGNOLI (O Estadão, 16/02/12)
A blogueira Yoani Sánchez, os aeroportos privatizados, os policiais amotinados  –  por três vezes, sucessivamente, o PT exercitou a arte da duplicidade, desfazendo com uma mão o que a outra acabara de fazer. Há mais que oportunismo na dissociação rotinizada entre o princípio da realidade e o imperativo da ideologia. A lacuna abissal entre um e outro sugere que, aos 32 anos, o maior partido do País alcançou um estado de equilíbrio sustentado sobre o rochedo da mentira.
Peça número 1: O governo brasileiro concedeu visto de entrada a Yoani Sánchez, enviando um nítido sinal diplomático, mas Dilma Rousseff se negou a pronunciar em Havana umas poucas palavras cruciais sobre o direito de ir e vir, enquanto seus auxiliares reverenciavam o "direito" da ditadura castrista de controlar os movimentos dos cidadãos cubanos. A voz do PT emanou de fontes complementares, que pautaram as declarações presidenciais na ilha. Circundando a Declaração Universal dos Direitos Humanos, diversos tratados internacionais e a Constituição brasileira, o assessor de política externa Marco Aurélio Garcia qualificou como um "problema de Yoani" a obtenção da autorização de viagem. Ecoando o pretexto oficial castrista, a ministra Maria do Rosário (dos Direitos Humanos!) declarou que Cuba não viola os direitos humanos, mas é vítima de uma violação histórica, representada pelo embargo norte-americano.
O alinhamento automático do PT à ditadura cubana revela extraordinária incapacidade de atualização doutrinária. A social-democracia europeia definiu sua relação com o princípio da liberdade política por meio de duas experiências históricas decisivas: a ruptura com os bolcheviques russos em 1917 e o confronto com a URSS de Stalin na hora do Pacto Germano-Soviético de 1939. O PT, contudo, não é um partido social-democrata. A sua inspiração tem raízes em outra experiência histórica, instilada no seu interior pelas correntes castristas que formam um dos três componentes originais do partido. Tal experiência é o "anti-imperialismo" da esquerda latino-americana, uma narrativa avessa ao princípio da liberdade política.
Peça número 2: Contrariando o renitente alarido petista de condenação da "privataria tucana", o governo leiloou três aeroportos para a iniciativa privada, mas, ato contínuo, o PT regurgitou as sentenças ortodoxas que compõem um estribilho estatista reproduzido à exaustão. Uma nota partidária anunciou a continuidade da "disputa ideológica sobre as privatizações", enquanto o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) se enredava na gramática da hipocrisia para formular distinções arcanas entre "concessões" e "privatizações".
A explicação corrente sobre essa dissonância radical entre palavras e atos aponta as motivações eleitorais de um partido que descobriu as vantagens utilitárias de demonizar adversários indisponíveis para defender a própria herança. Há, contudo, algo além disso, como insinua uma declaração do presidente petista Rui Falcão, que classificou os "adversários" do PSDB como "privatistas por convicção". O diagnóstico não faz justiça ao governo FHC, mas oferece pistas valiosas sobre a natureza de seu próprio partido.
O PT confusamente socialista das origens pouco se importava com o destino das empresas estatais, engrenagens do capitalismo nacional tardio erguido por Getúlio Vargas e aperfeiçoado por Ernesto Geisel. O partido só aderiu à ideia substituta do capitalismo de Estado após a queda do Muro de Berlim. No governo, aprendeu toda a lição: a rede de estatais configura um sistema de vasos comunicantes entre a elite política e a elite econômica, servindo ao interesse maior de perpetuação no poder e a uma miríade de interesses políticos e pecuniários menores. Os aeroportos foram privatizados para conjurar o espectro do fracasso da operação Copa do Mundo. Ao largo do território das convicções, sempre podem ser deflagradas novas privatizações: afinal, o partido antiprivatista tem como ícone José Dirceu, uma figura que prospera exercendo a função de intermediário entre o poder público e grandes grupos empresariais privados.
Peça número 3: O governo reprimiu o movimento dos PMs da Bahia e o PT condenou os atos criminosos de suas lideranças, mas não caracterizou a greve de militares como motim, deixando entreaberta a vereda para voltar a surfar na onda de episódios similares em Estados governados pela oposição. Os precedentes são conhecidos. Em 1992, quando o pefelista ACM governava a Bahia, o atual governador petista, Jacques Wagner, solidarizou-se com os PMs grevistas. Nove anos depois, quando a Bahia era governada pelo também pefelista César Borges, foi a vez do deputado Nelson Pelegrino, hoje candidato do PT à prefeitura de Salvador, proclamar seu apoio à greve dos PMs baianos. Durante a greve parcial de PMs paulistas, em 2008, no governo "inimigo" de José Serra, o PT formou uma comissão parlamentar de defesa do movimento.
A clamorosa duplicidade tem sua raiz profunda no papel desempenhado pelos sindicalistas do PT. A partidarização petista do movimento sindical moldou um corporativismo sui generis, que substitui os interesses da base sindical pelos do partido. No sindicalismo tradicional, tudo se deve subordinar às reivindicações de uma categoria. No sindicalismo petista, as reivindicações da base sindical devem funcionar como alavancas do projeto de poder do PT. Hoje, os PMs da Bahia são classificados como criminosos; amanhã, nas circunstâncias certas, PMs amotinados serão declarados trabalhadores comuns em busca de direitos legítimos.
O pensamento duplo não é um acidente no percurso do PT, mas, desde que o partido alcançou os palácios, sua alma política genuína. A tensão entre princípios opostos é real, mas não explosiva. Num país em que a oposição renunciou ao dever de discutir ideias, o partido governista tem assegurado o privilégio de rotinizar a mentira.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

PT aprova a existência de Deus

  Pastor Kassab ergueu a palma da mão e explicou: “
Sou católico, evangélico, espírita, umbandista, muçulmano, budista e judeu”
COLÉGIO SION - O PT aprovou uma resolução histórica na festa de seus 32 anos: com o voto de 97% dos seus delegados, o partido decretou que Deus existe. A decisão foi abençoada pela presença inesperada do pastor Gilberto Kassab, do PSD (Partido Samba com Deus). Depois de caminhar lentamente pelo palco, o mais novo aliado dos petistas tomou o microfone e disse, erguendo as mãos: "Deus não é de esquerda, não é de direita, não é de centro". Muitos petistas choraram de emoção quando Kassab abriu seu coração: “Eu comunguei”, admitiu o prefeito.
Insuflados pelo deputado Babá, meia dúzia de barbudinhos ateus ainda ameaçaram entoar o hino da Internacional Socialista. Mas foram logo esmagados pelos gritos que vinham do palco e ecoavam na plateia: “Aleluia! Aleluia!", bradavam todos. Desde que Lula deixou o poder não se via um santo ser tão ovacionado numa assembleia petista. De mãos dadas e olhos fechados, a presidenta Dilma Rousseff e o candidato Fernando Haddad diziam em uníssono: "Glória a Deus, Glória a Deus!"
Fazendo questão de não esconder sua alegria incontida com a presença do pastor Kassab, José Dirceu aceitou ser exorcizado. Depois, disse: "Se Deus existe, então tudo é permitido". E concluiu: "Está provado que o mensalão foi uma farsa, uma invenção do Cramulhão, do Coisa Ruim!".
A senadora Marta Suplicy se retirou antes do final. Contrariada naquele ambiente, protestou na saída: "Essa coisa de Deus vai contra nossos princípios. O Diabo veste Prada, é muito mais chique".
O PT aprovou ainda outra resolução, determinando o recolhimento imediato do dicionário Houaiss em todas as livrarias do país. Uma comissão do partido foi instalada para redefinir o significado da palavra "privatização".
O partido informou que o dízimo poderá ser pago com cartão de crédito.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Fatores

“Há uma série de fatores, que a lei não substitui,
e esses são o estado mental da nação, os seus costumes,
a sua infância constitucional...”

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

O Gambá do Futuro

Um dia, um gambá foi dormir pendurado pela cauda no mais alto galho de uma árvore. Quando acordou, viu uma grande serpente ferida, enrodilhada entre ele e o tronco da árvore.
Se eu me segurar”, disse ele para si, “vou ser engolido”. “Se me soltar, vou quebrar meu pescoço.
De repente ele teve uma ideia para disfarçar seu temor.
“Ó, meu amigo aperfeiçoado”, disse à serpente, “o meu instinto parental reconhece em você uma prova nobre e irrefutável da teoria da evolução”. “Sem dúvida, você é O Gambá do Futuro, o sobrevivente mais apto de nossa espécie, o resultado mais bem acabado da adaptação progressiva de se pendurar – você é toda uma cauda!”
Mas a serpente, orgulhosa de sua antiga eminência na história bíblica, era estritamente ortodoxa e não aceitou a visão científica.
Ambrose Bierce, Fábulas Fantásticas (1899)

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Ninauá



“– É melhor ver por si mesmo, Ninauá.
Cada um vê conforme o que procura.
Venha, aproxime-se. Assim o velho disse,
olhando na alma do olho de Ninauá.
A alma verdadeira, bedu yuxin.
O que o homem leva no coração é seu ponto de partida,
é seu destino. Onde estiver o coração,
aí está o seu tesouro.”
Este é o mote de meu recém-nascido livro, Ninauá, pela Editora Gulliver, minha mais nova incursão pela literatura infanto-juvenil, que chega às livrarias nesta segunda-feira.
Meu amigo, jornalista acriano Altino Machado, já me concedeu a honra de saudar Ninauá em seu blog, na terra que inspirou toda a história (leia mais aqui). Ela surgiu numa viagem que fiz pelo Acre, em 2006, em jornada pela floresta amazônica, durante um ritual na aldeia katukina. Altino e sua família me abriram as portas de sua casa e foi ele quem me deu o primeiro porto dessa aventura. Obrigado, Altino, por tudo.
A arte da capa é do carioca Rafael Nobre, sobre ilustração do artista acriano Ivan Campos e foto de Fernando Laudares.
Quanto à história, em essência, é isso:
 “Ninauá ensina: o coração, como as árvores, nasce onde ama. Ninauá é um curumim. Seu nome, herdado do pai, significa ‘grande homem da floresta’. Um dia, os daku nawás – os homens enrolados – invadem a aldeia de Ninauá e capturam seus parentes.
Em fuga, o indiozinho mergulha no igarapé, de onde sai à procura de sua gente. Seguindo em uma aventura pelas matas, Ninauá conta com a ajuda dos yuxin, os encantados, para encontrar seu povo e livrá-lo do cativeiro. Em sua busca, terá de enfrentar seu inimigo, o txakabu nawá. Homem mau e ambicioso, instigado pelas histórias de um velho índio jivaro, ele persegue um tesouro: acredita que a floresta esconde as lendárias minas do Rei Salomão.
Na aldeia das guerreiras amazonas, Ninauá aprende como derrotar o inimigo. Porém, é advertido: nada será como antes. Sua saga o levará ao seu destino, sob a luz de uma estrela guia, quando então o txakabu nawá descobre a verdade sobre si mesmo, quem é Ninauá e onde está escondido o verdadeiro tesouro.
A história do pequeno Ninauá conta a viagem do herói. É uma estrutura narrativa universal, cuja essência está contida nos mitos, contos de fadas e lendas que nos revelam como alguém se lança no caminho em busca de um bem e realiza a sua obra. Na verdade, é a história por trás de todas as histórias contadas infinitamente, de geração a geração, desde tempos imemoriais, com diferentes nomes e personagens, para expressar um conhecimento profundo, que toda alma traz consigo. Essa história mais antiga do mundo, diz o escritor Hajo Banzhaf, “é, ao mesmo tempo, uma história simbólica, uma parábola para o caminho de vida do ser humano. É isso que a torna tão fascinante, e é por isso que tem de ser contada e recontada, para que nunca nos esqueçamos por que estamos aqui na Terra e o que temos de fazer aqui e agora.”