domingo, 8 de maio de 2011

O deserto de Tepântar

RABINDRANATH TAGORE


Não sei que horas são, mãe.
Mas a luz do dia vai escurecendo no céu,
E não estou achando nenhuma graça no meu brinquedo;
Por isso vim para junto de ti.

Hoje é sábado, o nosso dia santo.
Deixa o trabalho, mãe; senta-te aqui junto à janela
E dize-me onde é o deserto de Tepântar,
do conto de fadas.

A névoa da chuva cobre o dia de um a outro lado.
Os relâmpagos arranham o céu com suas unhas de fogo.
Estala o trovão ribombando pelas nuvens.
Como eu gosto de ter medo, então, e de agarrar-me a ti.

Quando a chuva goteja horas nas folhas do bambual
e as janelas estremecem e rangem às rajadas do vento,
eu gosto de ficar no quarto sozinho contigo, mãe,
e ouvir-te falar do deserto de Tepântar, do conto de fadas.

Onde é que ele fica, mãe?
Na praia de que mar?
Ao pé de que montanha?
No reino de que rei?

Não há balizas que dividam as terras,
nem caminho que leve o vilão a sua vila,
nem vereda pela qual a mulher que cata lenha
possa levar a sua carga da floresta ao mercado.

Eu vejo daqui o deserto de Tepântar: a areia sem fim,
sobre a areia, manchas de relva amarela,
e só uma única árvore,
em que fez seu ninho
o casal de velhos pássaros encantados.

E eu imagino que, num dia nevoento como este,
o filho moço do rei vai atravessando o deserto,
montado num cavalo cinzento,
em busca da princesa
que está prisioneira no palácio do gigante,
em meio do lago misterioso.

Quando a cerração da chuva descer do céu longínquo
e o relâmpagos explodirem com acessos de dor,
ele há de lembrar de sua mãe infeliz,
abandonada pelo rei,
varrendo as cocheiras, e enxugando as lágrimas
enquanto ele cavalga pelo deserto de Tepântar,
do conto de fadas.

Vê, mãe, já está quase escuro o dia que se vai,
e não se enxerga um viajante, além, nas estradas.

O pastorzinho volta cedo do campo,
os trabalhadores deixam os serviços e, sentados,
abrigam-se sob o beiral das choupanas,
espiando a carranca das nuvens.

Eu também
deixei todos os meus livros na estante, mãe;
não me perguntes pelas lições agora.
Quando eu crescer e for grande como papai,
aprenderei tudo que é preciso aprender.
Porque hoje, mãe,
tu vais dizer-me onde fica o deserto de Tepântar,
do conto de fadas.

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